O Silêncio nas Relações Amorosas
- Kátia Silva
- 14 de jan.
- 4 min de leitura
Quando o silêncio é agressão e quando ele é solução?
Não importa a quanto tempo está o seu relacionamento: conversas difíceis são inevitáveis. Desde o primeiro dia, quando conhecemos aquela pessoa especial, experimentamos emoções satisfatórias pelas inúmeras coisas que temos em comum e, por outro lado, emoções difíceis de encarar, como a percepção de que ele (a) não é tudo aquilo que imaginávamos. O grande problema, no meu ponto de vista, não são, a princípio, as frustrações com o parceiro, mas a frustração de não ser compreendido.
Tanto o parceiro que arma o maior barraco quanto aquele que se fecha em silêncio estão, ambos, tentando compreender por que não conseguem se fazer entender um pelo outro.
Cada um, à sua maneira, sente um profundo descontentamento. Aquele que recorre a cobranças intermináveis, gritos, textos longos, repetições incansáveis, no fundo sente uma injustiça imensurável. Perceba que tudo nele é grande, como um sentimento inflamado, uma fúria que não cabe no peito. Esses sentimentos possuem raízes profundas e nem sempre estão de fato relacionados ao acontecimento vivido naquele momento, mas esse evento serve de gatilho para emoções não tratadas que se colam a ele de forma tal que quem o vive não consegue perceber, sozinho, a gravidade da situação que está causando. Essas situações normalmente se repetem, causando mais e mais dano.
Por um lado, temos um parceiro se sentindo sempre injustiçado, ameaçado, não amado, negligenciado e, por vezes, abandonado, reagindo a tudo isso com fúria, na tentativa de se livrar desses sentimentos incômodos.
Ah, como o sentimento de abandono, negligência ou injustiça é avassalador. Basta, às vezes, uma mensagem não lida ou não respondida, e pronto: o cenário está armado.
Por outro lado, o parceiro que recebe essas acusações peca por não ter habilidade para ouvir de fato as queixas e, por vezes, vive apenas se defendendo, ou sofre pelas várias tentativas de se explicar, muitas vezes sem sucesso, levando-o a optar pelo silêncio.
A habilidade de ouvir uma queixa é valiosa! Seja no ambiente de trabalho, quando a queixa vem travestida de crítica, ou nos relacionamentos amorosos, quando a queixa se manifesta por meio de um amontoado de reclamações, o que realmente está incomodando a pessoa que levanta a bandeira da discussão nem sempre é claro, exigindo do ouvinte uma dedicação importante. Surpreendentemente, às vezes a queixa é clara e precisa, mas, nesse momento, o ouvinte não está atento, sente-se atacado e dedica seu tempo se defendendo, em vez de acolher a insatisfação do outro como verdadeira.
Por falta de habilidade para falar ou para ouvir, no fundo, o que pesa é a falta de disposição para aceitar.
Quando o silêncio é agressão?
Penso que o silêncio é agressivo quando não permite ao outro saber o que se passa. A ausência de fala como ausência de comunicação, deixando o companheiro entregue às suas mais impiedosas cenas imaginativas.
Quando o silêncio é consequência?
Quando um dos parceiros é alvejado de críticas das quais não sabe o que fazer. Quando a situação o incapacita, seja pelo choque que gerou, pela surpresa ou pela falta de recursos (críticas sem contexto, fragmentadas).
Quando o silêncio é solução?
Quando é possível dizer: “Espere um pouco, preciso pensar! São muitas informações ao mesmo tempo, não estou conseguindo entender. Me dê 5 minutos, estou confuso.”Quando é possível estabelecer um espaço necessário de recolhimento, no qual as dúvidas, incertezas e as frustrações, que são próprias da natureza humana, possam surgir e abrir perspectivas criativas.
Atualmente, a relação do homem com o espaço e o tempo se modificou rapidamente, tornando difícil construir uma identidade baseada na memória, na somatória dos eventos em um sentido contínuo dos acontecimentos, nos quais as experiências vividas sejam integradas ao longo da história de cada um e do casal. Naquele momento, parece que tudo o que já foi vivido some, e o que sobra é a vivência da frustração, ou seja, o encontro com o que é estranho no outro.
Constrói-se, assim, um protagonismo, tanto para aquele que não vê a quem está atacando quanto para aquele que não ouve sobre o que está errando. No protagonismo, não é possível encontrar o silêncio e viver a experiência das vivências da intersubjetividade, que lhe permitiriam indagar-se sobre seu próprio sofrimento, elaborar e dar um sentido construtivo para si.
É justo lembrar que toda situação difícil rouba a razão de qualquer pessoa por instantes. O que diferencia aquelas mais capazes de resolver problemas das que não encontram solução para tal é a capacidade de retornar ao contexto histórico da sua vida. Deixar de ver apenas um recorte e passar a ver o todo, mesmo que para isso seja necessário um breve silêncio reparador.

Esse texto tem influência do artigo O Tempo Eróptico, Algumas Notas sobre o Mal-Estar do Silêncio e as Respostas da Contemporaneidade, de José Luiz Dias Tavares (PUC-SP), mas é uma reflexão pessoal que tem por objetivo propor-lhe instantes de silêncio, para reflexão e discernimento.
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